O antigo Preventório de Penacova, atualmente reformulado como Hotel, constituiu ao longo de grande parte do século XX, e início deste século, um marco importante, bem como uma referência para as pessoas da região e não só, inicialmente tratando-se de um lugar com um cariz vocacionado para o exercício de uma prevenção médica e social, e recentemente direcionado como pólo de atração turística.
A prática da medicina social constitui a primeira resposta organizada contra a tuberculose e outras doenças infeciosas. Com a reorganização do espaço urbano das cidades, e propagação de políticas de higiene sobre a população, a forma de encarar a doença começou a sofrer uma transformação. A crescente evocação das propriedades benéficas da natureza, sugeridas pelos médicos, e economicamente aproveitadas pelas entidades turísticas, levou a que surgissem na Europa, sobretudo uma série de equipamentos, de onde se destacaram os sanatórios, como edifícios que forneciam a resposta eventual para a cura da doença, ao mesmo tempo que proporcionavam o conforto que até aí não existia nos equipamentos hospitalares.
Em Portugal, a construção de Sanatórios e de outros edifícios similares, como o Preventório, surgiu com algum atraso em relação ao verificado na Europa, assistindo-se sobretudo a partir do início do século XX, a um aumento nessa construção. Numa primeira fase, fruto de iniciativa privada, e posteriormente liderado pelo Estado, o combate não esteve apenas na construção destes equipamentos, como também numa série de acções políticas e filantrópicas que incutiam hábitos à população, de onde se destaca a Associação Nacional de Tuberculose. No distrito de Coimbra foi desenvolvido um plano contra a tuberculose, pela Junta da Província da Beira Litoral, liderada pelo Professor Bissaya Barreto, figura com uma personalidade misteriosa, com um trajeto político e pessoal que lhe conferiram muito do poder para se impor na vida pública, como acabou por o fazer.
O grande responsável pela existência deste Preventório, é o professor Bissaya Barreto, que na sua rede de edifícios criados na necessidade de prestar cuidados no apoio à defesa da criança e da grávida, isto englobado no seu projeto social e médico de combate à tuberculose, salientou a necessidade da criação de um local que albergasse crianças com condições socioeconómicas desfavoráveis, tendencionalmente mais suscetíveis à tuberculose, ou ainda crianças que tivessem sido retiradas aos pais, por estes manifestarem a doença.
A criação deste Preventório em Penacova foi conceptualizada em 1930, numa exposição feita por Bissaya Barreto, que fruto das suas viagens pelos principais países da Europa, elaborou uma exposição enaltecendo a assistência antituberculosa que era feita nesses países, nomeadamente a apologia pelos Dispensários e Preventórios, que o levou enfatizar a necessidade imperiosa da construção deste Preventório. Aproveitando a construção já adiantada do Hospital da Santa Casa da Misericórdia no Monte Senhora da Guia, estabeleceu-se um acordo em 1930, com a Escritura a ser assinada no ano a seguir, onde ficou registada a cedência desse edifício, bem como dos terrenos adjacentes. Contudo, este acordo implicou algumas contrapartidas por parte da Junta Geral, que também elas ficaram registadas no contrato celebrado. Acima de qualquer uma das cláusulas estava a obrigatoriedade de naquele edifício se construir apenas e só um Preventório, vulgo Sanatório para crianças não portadoras de tuberculose pulmonar.
A escolha de Penacova, e em específico do Monte Senhora da Guia, para a construção do Preventório foi com base numa determinada representação da paisagem que articula saúde e estética, muito própria da conceção da medicina social praticada por Bissaya Barreto. A dita medicina das “coisas” que Foucault considerou, e que estão na linha do pensamento médico e social de Bissaya Barreto alicerçado nessa medicina urbana francesa, encontra no local onde se situou o Preventório as tais correntes benéficas de ar fresco, por estar localizado num local alto e isolado. Outra opção que orienta essa articulação prende-se na incidência solar que acolheria o Preventório, uma vez que este foi direcionado para sul, o que nos remete para a helioterapia muito seguida por Bissaya Barreto. Presente está também a importância do enquadramento paisagístico que o local oferecia, como se atesta nas palavras do próprio do Bissaya Barreto (1970 ):
“(…)uma razão que determinou a fundação do Preventório de Penacova, o primeiro instituto do género, foi a localização numa paisagem maravilhosa, com um clima maravilhoso (…) “
A verdade é que o funcionamento do Preventório se passou a efetuar na prática nos primeiros dias de Maio de 1934, apesar da manifesta inquietude de Bissaya Barreto, que várias vezes mostrou o desejo de abrir o quanto antes aquela obra. Integrado, simultaneamente, dentro das Obras de Profilaxia Anti-tuberculosa e de Protecção à Grávida e Defesa da Criança sobre a égide da Junta Geral de Coimbra, o Preventório ocupou um lugar de relevo durante décadas, até que seria votado ao abandono na década de 80. Posteriormente após alguns anos de indefinição a solução encontrada para a revitalização do local foi a construção de um Hotel, centrando-se apenas hoje unicamente com a finalidade turística.